domingo, 31 de agosto de 2014

INVENÇÃO DO BRASIL | Prólogo




Primeiras entrevistas que fiz a brasileiros foram a Gonzaguinha, Moraes Moreira e um artista plástico cearense chamado Zé Pinto. Final dos anos 1970. Início da década seguinte eu mudei minha residência de Fortaleza para São Paulo e ali entrevistei poetas como Roberto Piva, Claudio Willer e Jamil Almansur Haddad. Eram então realizadas ao vivo, com um pequeno gravador, seguidas de um exaustivo trabalho de transcrição. Logo vieram as entrevistas através da troca de cartas. Salvo engano as primeiras delas foram com José Paulo Paes, Teixeira Coelho, João Silvério Trevisan, entre muitas outras. Eram publicadas de imediato e simultaneamente no SLMG (Suplemento Literário Minas Gerais) e no suplemento dominical do Diário do Nordeste, em Fortaleza. Embora do ponto de vista do rendimento expressivo fossem entrevistas que oferecessem um corpo mais substancioso ao leitor, lhes faltava a contestação imediata, a contra-argumentação do entrevistador. Este aspecto foi finalmente resolvido com o surgimento da Internet, que me permitiu enviar as perguntas por etapa, ampliando o diálogo de acordo com as respostas do entrevistado. Foi assim que surgiram entrevistas a nomes como Antonio Cícero, Marco Lucchesi, Lêdo Ivo, Maria Lúcia Dal Farra, enfim, a maior parte dos diálogos aqui presentes.
Paralelamente às entrevistas com brasileiros fui mapeando a América Hispânica, neste caso entrevistando primeiramente seus poetas. Uma primeira compilação dessas entrevistas resultou no livro Escritura Conquistada (1998), edição nacional, fora de mercado, com 24 entrevistas, que teve posteriormente uma edição espanhola ampliada (Venezuela, 2009), em dois volumes que reuniam 52 entrevistas a poetas em todo o continente hispano-americano & Brasil. Meu trabalho de edição da Agulha Revista de Cultura, assim como as pesquisas em relação ao Surrealismo, permitiu uma ampliação de fronteiras e temas, de modo que também passei a entrevistar pessoas na Espanha, em Portugal, nos Estados Unidos, no Canadá… E não mais apenas o mundo literário, ou seja, os diálogos passaram a ser também com nomes ligados à música, às artes plásticas, ao teatro etc.
As entrevistas aqui reunidas – unicamente aquelas feitas a brasileiros – são fruto dessa estrada fascinante, e perfazem um período que vem de 1984 a 2012. A intenção é espelhar um corpo crítico variado no que diz respeito à criação artística e também à visão de mundo dos entrevistados, permitindo ao leitor uma compreensão tanto sincera quanto diversificada de um caudaloso dilema que nos irmana a todos e que se chama Brasil. Invenção do Brasil é um título que desde o princípio soube se impor, pois é exatamente disto que se trata. Quando um país parece fugir de si, como uma entidade viva que teme aceitar sua identidade, é hora então de inventá-lo. O compositor Tom Jobim costumava dizer que o Brasil é um país para profissionais. Essa aparente boutade incomoda como uma fístula. Este livro é uma ampla mesa de diálogos em que me sento para escutar um conjunto de vozes, independente de suas coincidências ou dissidências entre si. O ouro buscado aqui é o da visão múltipla que possa dar ao leitor referências para ajustar, confirmar ou desmentir sua própria ideia do que seja ou possa vir a ser este país chamado Brasil.

[2013]

[Invenção do Brasil. São Paulo: Editora Descaminhos, 2013. http://www.amazon.com/Inven%C3%A7%C3%A3o-Brasil-entrevistas-Portuguese-Edition-ebook/dp/B00FTBMR24] 

Nenhum comentário:

Postar um comentário